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CAPA |
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CONTRA CAPA |
A energia criativa natural
Anna Marie Holm
Eu afirmo: se dermos às crianças
a mesma liberdade no processo artístico que lhes damos em suas brincadeiras, as
crianças chegarão à excelência no aprimoramento do processo criativo. O artista
dinamarquês/islandês Olafur Eliasson diz: ‘’Eu encaro o meu processo artístico
como um projeto de pesquisa. Atualmente, os artistas têm liberdade para
pesquisar coisas das quais não têm nenhum conhecimento. É isso o que estou
fazendo. E percebo que essa forma de trabalhar – testando coisas, fazendo
experiências – está aperfeiçoando meu trabalho, quer eu faça exposições ou não.
’’
Transferindo isso para meu
trabalho com as crianças:... é exatamente assim que elas trabalham. As crianças
são curiosas, pesquisadoras, mergulham nos projetos – o campo aberto. Na
oficina com as crianças, eu trabalho acreditando no pessoal, no sentimento de
liberdade, no irracional, no natural orgânico. Sinto alegria em tudo o que as
crianças fazem naquilo que simplesmente trazem consigo – eu sou muito
privilegiada por ter essas experiências criativas junto a elas. As crianças
deveriam aprender a pesquisar, a ter confiança em si mesmas e a ter coragem de
se pôr a trabalhar em coisas novas. As crianças não deveriam ser preparadas
para um tipo determinado de vida; deveriam, sim, receber ilimitadas
oportunidades de crescimento. Aprendendo que uma tarefa pode ter várias
soluções, adquirimos força e coragem. As crianças adquirem isso na oficina de
arte. Eu lhes apresento um desafio, que nunca tem uma resposta definida. Meus
desafios não têm uma resposta única, podem ser resolvidos de várias maneiras. À
medida que o trabalho se desenvolve, tornam-se cada vez mais abertos, incomuns
e irracionais. Uma tarefa artística realmente boa é fazer com que os seus
alunos pensem o oposto , pensem de maneiras totalmente diferentes...!
ESPAÇO, CORPO, MATERIAL, TEMPO, O
ADULTO – cinco fatores centrais que não devem limitar:
... o estar num espaço
desafiador; a disponibilidade para o corpo se movimentar livremente;
a decisão
pessoal da criança de onde ficar na sala;
a escolha de materiais pela criança;
a oportunidade de experimentar;
o controle do tempo;
a conversa, o bate-papo;
a
liberdade da criança para ser ela mesma.
Espaço livre e a ausência de
limitações são as minhas palavras-chave para a oficina experimental de arte. Na
verdade, quero apenas uma oficina aberta a todas as possibilidades.
Evidentemente, as crianças são loucas para ouvir minhas histórias estranhas.
Elas vêm pelas histórias e sabem que podem adotar meus estímulos livremente.
Querem também aprender técnicas. O processo de trabalhar com imagens promove
uma auto-realização que nem sempre pode ser detectada no produto final . A
execução em si é a parte mais forte do trabalho. A avaliação final dos
trabalhos produzidos por crianças é uma invenção dos adultos. O que ocorre
durante a experiência estética é mais amplo. A compreensão se dá por meio dos
sentidos, ampliando a consciência. O interessante é que não temos que chegar a
nada especifico. Eu descubro as histórias, o que exige muito esforço. Mas as encontro
porque gosto de fazê-lo. Eu mesma me conecto com as histórias. Sou uma
entusiasta. Gosto de estar nesses processos de investigação.
É importante que nós próprios
sejamos bons em tomar a iniciativa, inventar, ter coragem, energia, ter a mente
aberta para experimentar, para investigar, para estar no desconhecido. Fazemos
tudo isso na Oficina de Arte. Desenvolvemos o senso artístico, a compreensão da
arte, penetrando nela, deixando que nos modele. As crianças tornam-se, assim,
cada vez mais confiantes no que diz respeito a valores intrínsecos. Graciela
Sacco conta: ‘’Quando eu estudei na Academia de Belas-Artes, na Argentina,
aprendi a desenhar e a pintar. Desde então essas atividades deixaram de ser uma
escolha natural para mim. Não se adaptam às coisas que quero expressar.
Buscamos materiais que combinem com nossa história’’.
Eu acredito que as crianças se
sintam exatamente assim. Muito frequentemente, escolhemos técnicas de
desenho/pintura/modelagem para elas. Mas, pela minha vivência, quando as crianças
têm a oportunidade de escolher materiais diferentes, elas o fazem. Elas
encontram o que é mais adequado para elas. Fazem, produzem imagens, pintando e
montando instalações a partir de materiais que os adultos nem sonhariam em juntar. De repente,
fantásticos espaços e trabalhos vão surgindo. As crianças têm um gosto
abrangente e magnífico. Eu acredito na energia e no prazer. Não tenho nenhuma
ambição de mudar as crianças. Sou movida pelo desejo de estar coma as crianças.
Tenho a mente de um saltimbanco e o desejo de liberdade. Sei que é preciso
haver sensação de liberdade para criar.
Quando nos expressamos, temos que
aprender sobre todos os tipos de materiais. Atualmente, a arte pode ser
interpretada de inúmeras formas, logo, a compreensão artística tem que ser
aberta, não fechada. No meu tempo de escola, os materiais disponíveis se
resumiam a um pequeno estojo de lápis e um pequeno estojo de giz colorido. O
giz ia gradualmente se reduzindo e um monte de tocos, que eram colocados numa
caixa de sapato. Vou contar uma coisa: uma vez, durante uma dessas aulas de
desenho, no final da quarta aula, eu me sentei com a caixa de sapato e peguei
alguns daqueles tocos de giz que eram um pouco mais grossos que os outros. Eram
encantadores, e acho que foi naquele momento que descobri que eu podia fazer
algo com formas e cores. Foi como se todas as paredes se abrissem. Os tocos de
giz eram macios; nenhuma resistência no papel, que tinha ficado amarelo, as
cores eram intensas, fortes e podiam colorir em camadas, em formas orgânicas.
Lembro-me de que fiquei completamente absorta. Então, apareceu a professora de
desenho e viu o que eu estava fazendo. Os grossos tocos de giz colorido foram
arrancados de mim. ‘’Deve ser um engano’’, disse a professora, ‘’como é que
vieram parar aqui?’’. Fim da aventura.
Hoje em dia, as crianças têm
acesso a todo tipo de cor, mas, geralmente, sob supervisão. Eu acredito que
muitas das experiências das crianças seriam muito melhores se os professores,
em vez de gastarem tanta energia vigiando-as, procurassem, eles mesmos, testar
as cores e usufruir o prazer advindo da experiência.
(Páginas 9 e 10)
Cheiro de cachorro molhado
Segunda-feira, 26 de fevereiro.
Materiais: Papéis para pintura, pranchetas e tinta acrílica
Para entrar, rapidamente, num
clima de pensamentos e formas desconhecidas, a proposta inicial da aula era
pintar o cheiro de alguma coisa. Orientei: ‘’Pintem o cheiro de batatas fritas
– não a forma delas, mas a sensação do vapor. A primeira coisa que vem a mente
são imagens da realidade. Mas isso logo passa’’. ‘’Agora o cheiro de lugar de
guardar bicicleta’’. Eles logo começaram a trazer suas sugestões. Alguns saíram
à procura de cheiros. Outros estavam concentrados, com os olhos fechados,
farejando com seu nariz. Terminamos o trabalho com pinturas maravilhosas de
cheiro-de-amor, de pés-sujos, sovacos-suados, da encharpe-da-minha-mãe, cheiro-de-cachorro-molhado,
cheiro-de-verão e outros mais. Uma divertida tarde cheirosa.
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Tenna, 8 anos. |
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Naja, 9 anos. |
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''CHEIRO DE BATATAS FRITAS''. Jack, 14 anos. |
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''CHEIRO DE CACHORRO MOLHADO''. Julie, 9 anos. |
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''CHEIRO DOS BOLINHOS DA VOVÓ''. Anne Mette, 9 anos. |
(Páginas 26 e 28)
que bom ver isso aqui!
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